Por Rosangela Dias
A editora Apicuri iniciou suas
atividades publicando textos oriundos da academia e, até hoje, a maioria de seu
catálogo é composto por este tipo de livro, apesar das dificuldades. Uma delas
é o fato de que este tipo de publicação possui um retorno, quando tem, a longuíssimo
prazo. Mas há outra dificuldade, esta até mais complicada, que é mostrar para
os escritores do meio acadêmico o que é um editor e a importância do mesmo.
Geralmente, estes autores, quando sabem o que faz um editor, temem que o mesmo
descaracterize de tal forma o texto original que as ideias, as análises, o
quadro teórico-conceitual, enfim, tudo aquilo próprio a um trabalho acadêmico
se perca.
Não é isso o que a Apicuri propõe. O
que a editora busca é publicar livros “que incentivam a leitura e contribuem
para a circulação de textos e autores de origem acadêmica” e pretende fazer
isso “sem perder de vista aqueles que simplesmente gostam de ler.” Daí o editor
se preocupar em transformar uma Dissertação ou Tese em livro acessível a todos.
Os acadêmicos da área de Ciências Humanas e Sociais franceses e ingleses
conseguiram isso e para além do território pátrio. Conhecemos obras de Jacques
Le Goff, Georges Duby, Eric Hobsbawm e outros cientistas sociais europeus que
são também “escritores”. Conseguem unir o prazer da leitura à investigação
científica que fazem. Certamente, pela quantidade de edições que seus livros
possuem, a Era dos extremos, de Eric
Hobsbawm, já está na décima edição, não são lidos somente por cientistas
sociais.
Mas, o objetivo deste pequeno intróito
é mostrar que um editor faz falta, quando o autor, no caso do exemplo, os
autores, dorme ou cochila. O vacilo ocorreu no jornal O Globo de sábado (14/04/2012), na seção História. O artigo “A arte
da guerra” mostra como no século XIX e início do XX a pintura foi uma espécie
de “ícone da denúncia”, papel que ao final do século XX e no XXI passou a ser
desempenhado pela fotografia e outros suportes ou linguagem artística como
vídeo, instalação, performance. Os autores do texto apontam as pinturas “Três de
maio de 1808”, de Goya, “A liberdade guiando o povo”, de Delacroix, e
“Guernica”, de Picasso, telas importantes, não só pelo valor artístico, mas
pelo fato de denunciarem chacina, guerra e governo.
Até aí tudo bem, o escorregão, ou
tombo, acontece quando é feita uma comparação entre essas pinturas panfleto com
similares nacionais. Uma das obras nacionais citada é a “Batalha de Guararapes”,
pintada em 1879 por Victor Meirelles. Já considero que, em termos de
comparação, a escolha deixa a desejar, já que o quadro foi encomenda e visando
enaltecer o poder estabelecido, no caso o Império. Mas o pior é quando a obra é
descrita como “uma pintura sobre o confronto 30 anos antes, entre
luso-brasileiros e holandeses, no sul do Recife.” A batalha de Guararapes se
deu no século XVII, em 1649. “O episódio”, continua o artigo, “foi decisivo
para que os holandeses deixassem Pernambuco, onde haviam se instalado” e a obra
fora encomendada por D. Pedro II para “exaltar o Império, vencedor daquele
confronto”. Os holandeses se instalaram em Pernambuco em 1624 e de lá saíram em
1654 , quando o Brasil nem era Império, mas sim uma das colônias do Reino de
Portugal, a América Portuguesa. Como mais a frente outra obra de Victor
Meirelles é citada, a “Batalha do Avaí”, esta sim retratando um confronto
vencido pelo Império, a Guerra do Paraguai, penso que pode ter havido confusão
e mistura de datas e batalhas.
Todos cochilaram ou dormiram, autores
e editores. Quanto aos leitores, ficaram mal informados ou indignados, como eu.