Por Rodrigo Novaes de
Almeida
Aqui [no
Brasil] me parece o lugar onde tudo está começando, disse o escritor
irlandês John Banville. Isto me fez pensar em Claude Lévi-Strauss: Aqui tudo
parece que é ainda construção e já é ruína.
Escrevo nesta manhã de domingo, último dia da décima
primeira edição da festa literária internacional de Paraty, na beira da piscina
da pousada, uma bela manhã: há sol, há céu azul, há brisa do mar, e os cheiros
de alimentos de temperos já escapam das cozinhas e tomam as ruas de pedras do
centro histórico. Escrevo nesta manhã de domingo para me despedir desses últimos
dias.
Aqui, por mais conectados que estejamos, mesmo que as
redes fiquem congestionadas e a ponto de um colapso — ontem só consegui conexão
perto da meia-noite —, o mundo só entra se o deixarmos; soube que derrubaram o
governo no Egito. Egito que chegou a mim outro dia aqui, na Tenda dos Autores,
enquanto assistia a um dos vídeos que antecedem a mesa, com um senhor grisalho
lendo trecho da obra de Graciliano Ramos, o homenageado desta festa. Ele estava
em um corredor de uma biblioteca e a leitura falava de minúcias de um cotidiano
que me levou a fragmentos de papiros de cerca de seis mil anos, de uma
humanidade tão longe e tão perto de nós.
Talvez esta seja a magia de Paraty e da FLIP. Porque
me sento aqui, diante do laptop, na beira da piscina da pousada, em que há sol,
o mesmo sol, em que há céu azul, o mesmo infinito azul, em que há brisa de um
mar eterno, em que há o humano atravessando o arco das eras e colocando em
palavras o seu espanto diante do mundo.