quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Entrevista com Jozias Benedicto, autor de Estranhas Criaturas Noturnas

Foto: Rico Silva


Jozias Benedicto é artista visual, escritor, editor, multiartista. No seu livro de estreia, Estranhas Criaturas Noturnas, que a Apicuri lança no próximo dia 25 de novembro, ele constrói 23 narrativas entre palavra e imagem, explorando o subterrâneo virtual de seus personagens. Nesta entrevista, Jozias fala sobre o seu processo criativo, os temas abordados no livro, as influências artísticas e as fronteiras e interseções entre literatura e artes visuais.

Como o seu trabalho de artista visual influenciou na construção desse livro de estreia e na sua relação com a literatura?

No meu trabalho em arte faço uma junção entre imagem e texto, sou um artista que transita no espaço entre o visual e a palavra. Desta forma, pensei o livro como um "híbrido" de literatura e artes visuais, são textos que se interrelacionam e onde as imagens (da série de fotos "Linhas de varredura") não aparecem "ilustrando-os", e sim como uma outra narrativa, com sua dubiedade e sua especificidade. Um "livro de artista", que se soma aos meus trabalhos com vídeonarrativas, como a série de vídeos feitos no Palácio do Catete, que faz parte da minha exposição individual "ficções:", com abertura prevista para 14 de dezembro na Galeria do Lago, no Museu da República. 

Quais foram os escritores que mais o influenciaram na vida artística?

As influências na escrita foram o Rubem Fonseca, o Bernardo Carvalho, o Luiz Ruffato e, claro, o Machado de Assis. Atualmente estou lendo muito Michel Laub e Carola Saavedra. Tenho sempre em mente outros artistas visuais que exploram a interseção entre imagem e palavra: Nuno Ramos, Laura Erber... Também me interesso muito pelo trabalho da Sophie Calle e de outros artistas que atuam na ambiguidade entre memória e ficção.

Os contos de Estranhas Criaturas Noturnas trazem questões muito contemporâneas, como a sexualidade exercida via internet e um certo tédio urbano de classe média. Essas são questões que se relacionam em alguma medida e fazem parte das inquietações que o levaram a escrever o livro?

A meu ver a internet trouxe um novo paradigma nas relações interpessoais e no potencial de exercício da individualidade, em especial no que diz respeito à sexualidade. Todos os fetiches são democratizados, ficam ao alcance de um click no browser. Por outro lado, certas funcionalidades dos aplicativos, como deletar, excluir e bloquear, estão influenciando nossas atitudes no campo do real: quantas pessoas se deletam, nos bloqueiam, desaparecem de nossa vida tão totalmente como se exclui um perfil em um site? E ao mesmo tempo, essa classe média urbana está ancorada em um Brasil arcaico, tradicional, de tias, doces caseiros e segredos furtivos. É isso tudo o que procuro explorar nesse meu livro.

Nos agradecimentos do livro você cita a oficina de Vivência Literária da Estação das Letras, com o escritor Luiz Ruffato. Como foi essa experiência, de certa forma, mais coletiva de escrever e de que maneira ela marcou o desenvolvimento do seu livro?

Participo há cerca de três anos dessa oficina de Vivência Literária, que foi fundamental para o crescimento do meu texto e do meu processo de trabalho. Sempre escrevi, mantive um blog por anos, mas a oficina me desafiou a buscar mais: maior concisão e precisão nos textos, busca de uma voz pessoal, de trabalhar em um projeto ao invés de escrever coisas meio dispersas. Na oficina, cada autor lê seu texto em voz alta para os demais participantes, que depois o discutem, e o Luiz Ruffato atua como um moderador, sem ensinar regras ou fórmulas. Além de importantíssimo para trabalhar a clareza e o ritmo da escrita, no meu caso essas leituras foram o embrião do trabalho que desenvolvi nos vídeos que mostrei no Oi Futuro (Rio e Belo Horizonte) e no Museu das Comunicações (Lisboa). 

Há novos projetos atualmente?

Como mencionei acima, estou finalizando os textos e vídeos da exposição "ficções:", que inauguro em dezembro, na Galeria do Lago. Em paralelo, estou trabalhando com a atriz e professora de teatro Ana Kfouri e a artista visual Helena Trindade em pesquisas que já avançam para explorar as fronteiras entre artes visuais, texto e teatro. E também "costurando" meu segundo livro de contos, onde exploro mais radicalmente as ambiguidades entre memórias reais e inventadas. São muitas ideias, meu processo de trabalho é meio caótico e obsessivo, mas me dá muito prazer chegar a trabalhos prontos para "ir para o mundo", como o Estranhas Criaturas Noturnas, e espero que o leitor compartilhe deste prazer!