1. “Dança ao pé da letra: do romantismo a
Belle Époque carioca”foi, originalmente, uma dissertação de
mestrado. Por que a escolha desse tema e o que trouxe de novo para a
pesquisa sobre a dança e arte cênica?
De início, o tema era o compère do Teatro de Revista porque o mestrado era em teatro, então tinha que falar sobre teatro… Mas, na verdade, queria mesmo falar sobre a dança no Rio de Janeiro. Há algum tempo havia formatado um projeto de pesquisa sobre a dança de salão “de rosto colado” para a RIOARTE, que não foi aceito e tinha ficado na gaveta. Assim, diante da minha resistência com o compère, uma professora do curso sugeriu que eu retomasse esse projeto e minha orientadora topou. Na época, quase não havia bibliografia sobre estética da dança nem documentação específica sobre as danças cariocas, de maneira que praticamente tivemos que inventar as referências e, por isso, recorri à literatura, encontrando nela uma fonte inesgotável de informações. A novidade foi considerar a relação profunda que há entre dança e literatura e admitir a literatura de ficção como fonte de referência.
2. Conte-nos um pouco da sua trajetória profissional, e de que forma o mestrado e, também, o doutorado, influenciaram e influenciam na sua carreira.
Passei anos da minha vida, de 1973 a 1989, dançando e trabalhando no teatro. Já trintona, resolvi estudar para entender o que estava fazendo e entrei logo para o curso de teoria do teatro, porque ainda não havia nenhum curso superior de dança. Foi então que incorporei a teoria na prática e isso fez toda a diferença na minha vida profissional. O curso de teoria do teatro da UNI-RIO era excelente, de maneira que fui apurando e desenvolvendo o gosto pela literatura e pelas artes em geral. Assim percebi a dança como uma linguagem abrangente que se relaciona com tudo: desde o movimento funcional cotidiano à expressividade mais abstrata. A dança é a linguagem poética do movimento que está nos palcos, nas artes plásticas, nas artes visuais, no cinema, na literatura, na música e na vida de todo o mundo. É o ponto equidistante entre a arquitetura (a mais concreta das artes) e a música (a mais efêmera).
3. Como chegou a este tema abordado no “Dança ao pé da letra: do romantismo a Belle Époque carioca”?
Na graduação tive uma excelente professora que abordava o teatro brasileiro da virada do século XIX para o XX através da literatura e da influência francesa. Esse período da virada foi muito rico e controverso. Os autores brasileiros românticos e naturalistas de certo modo denunciavam a sociedade burguesa e seu falso moralismo, principalmente no que dizia respeito ao comportamento da mulher na sociedade. Creio que foi um período de afirmação, ascensão e exibicionismo, quando os negócios, os casamentos e a política eram tratados nos salões. Influenciada pelas grandes precursoras da dança moderna: Loie Fuller, Isadora Duncan, Ida Rubinstein, Ruth Saint-Denis, entre outras que se aventuraram a levantar a bandeira do feminismo, o tema dos salões, do comportamento e dos modos de dançar me interessam até hoje.
4. Quais as dificuldades maiores para a pesquisa? E que pesquisa faz atualmente?
A maior dificuldade para a pesquisa em dança é a escassez de fontes de referência. Ainda hoje é muito pequena a produção crítica e ensaística sobre dança. Só temos uma pós-graduação strictu senso que é da UFBA. Quase nenhuma documentação. A história da dança no Brasil se resume a levantamentos de espetáculos e de nomes, e quase nada de análise estética ou de reflexão sobre as tendências estéticas. Ainda não podemos dizer que haja um pensamento associado a uma prática… Há sim o desejo, a produção, mas não temos ainda um corpo teórico relevante. Atualmente, sigo na trilha da integração da dança com outras linguagens artísticas e minha pesquisa gira em torno da literatura e da filmografia de Marguerite Duras. Estamos preparando um filme de dança e um livro sobre isso.
5. Qual interesse maior em publicar o livro? Quais as expectativas? Alguma coisa que queira acrescentar?
Meu interesse em publicar o livro é contribuir para aumentar a bibliografia sobre dança e também mostrar que podemos encontrar em fontes literárias de ficção muito material pelos quais podemos pensar a dança. Se ainda não temos referências suficientes, podemos inventá-las, recorrendo não só a literatura mas a outras fontes artísticas. Sou a favor da integração de linguagens que se retroalimentam. Minha expectativa é estimular a criação artística no sentido do produto acadêmico, isto é, podemos transformar o modelo “careta” em algo mais inventivo.