terça-feira, 10 de julho de 2012

Mesa: O avesso da pátria


Por Rodrigo Novaes de Almeida

Como fazer amor com um negro sem se cansar é o inusitado nome do livro de estreia de Dany Laferrière, escrito há cerca de trinta anos. O público presente se entusiasmou com a leitura de um trecho do livro pelo autor. Antes, Zoé Valdés lera um trecho do seu livro também, mas problemas técnicos no microfone interromperam a leitura e o seu fluxo narrativo. Valdés é autora dos livros O nada cotidiano e O tudo cotidiano, que, juntos, formam O todo cotidiano. Pátria, exílio, autobiografia e ficção, sexo: temas em comum nos livros dos dois convidados desta mesa. A mediação foi da escritora e jornalista portuguesa Alexandra Lucas Coelho, que vive no Rio de Janeiro.

Zoé Valdés é cubana e nasceu no ano da revolução, em 1959. Escreveu, entre outros livros premiados, O nada cotidiano. Este, clandestinamente em Cuba, enviando-o para a Europa pouco antes de se exilar em Paris, com a sua filha. Neste romance, ela conta a história de Pátria, seus amores, amigos e família, mas essencialmente de todos aqueles que ficaram em Cuba e viveram e ainda vivem sob o fracasso da revolução castrista.

Dany Laferrière nasceu em 1953 em Porto Príncipe, no Haiti, e em 1976 exilou-se em Montreal, no Canadá, fugindo da ditadura de Baby Doc. Em 1985, publicou seu primeiro livro, Comment faire l'amour avec un nègre sans se fatiguer (Como fazer amor com um negro sem se cansar), adaptado para o cinema pelo diretor canadense Jacques Benoit e lançado no Brasil somente agora (durante a Flip), pela Editora 34.

Como fazer amor foi escrito numa época em que eu era furiosamente livre”, afirmou Dany. No exílio, trabalhou em fábricas até que um dia comprou uma máquina de escrever Remington 22. Sentou diante dela e não parou mais de escrever.

Sexo e ficção

“Interessa-me escrever o desejo, principalmente o desejo da mulher, mas também o do homem. A dor do sexo, a ternura, o amor, o orgasmo feminino, as sensações”, disse Zoé, colocando o sexo como uma afirmação de identidade. Dany, por outro lado, politiliza até o sexo, considerando-o libertador.

Apesar de os dois escritores praticamente não conversarem entre si, foi uma mesa rica de ideias e experiências. Zoé disse ainda que a noção de pátria mudou e hoje está mais ligada à política do que à cultura. E admitiu que todas as noites, quando pega o seu computador e cadernos para escrever, retorna para a sua Cuba. Já Dany provocou risos do público ao afirmar que, quando quer saber notícias do Haiti, liga para a mãe e pergunta não como vãos as coisas no país, mas como ela está. O humor e a saúde da mãe servem como termômetro da situação no país. Ele também se comparou aos pintores primitivos – “seus verdadeiros mestres” –, dizendo-se “um escritor primitivo”.

“Somos animais leitores”, arrematou ainda, definindo perfeitamente todos que ali se encontravam naqueles cinco dias de festa, reflexão e literatura em Paraty.